Contribuição social sobre remuneração.

A correta delimitação da base de incidência das contribuições previdenciárias sobre a remuneração, nos termos dos incisos I dos artigos 22 e 28 da Lei nº 8.212, de 1991, de forma compatível com a competência constitucional, é muito relevante pela sua repercussão no custo da atividade econômica e no custeio previdenciário.

A base de incidência se encontra definida como sendo “o total das remunerações pagas, devidas ou creditadas a qualquer título, durante o mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos que lhe prestem serviços, destinadas a retribuir o trabalho, qualquer que seja a sua forma.”

A partir da regra de competência da alínea “a”, inciso I do artigo 195 da CF e de sua regulamentação legal, a melhor doutrina delimita que a remuneração passível de tributação é aquela que possui as características da habitualidade e do caráter remuneratório do trabalho ou serviço.

Contudo, na aplicação concreta se avolumaram os conflitos entre Fisco e contribuintes, principalmente pelo entendimento usual das autoridades de que somente estariam excluídas as verbas elencadas no parágrafo 9º do artigo 28 da Lei nº 8.212, de 1991.

A matéria vem sendo apreciada pelos órgãos de julgamento administrativo e pelo Poder Judiciário nas últimas décadas, sendo que atualmente já se tem um sólido arcabouço jurisprudencial.

Cada vez mais sólida a delimitação de a contribuição abarcar só verbas habituais
O primeiro pressuposto é o de que o citado parágrafo 9º não é exaustivo e sim exemplificativo, já que qualquer verba que não se adequar ao conceito de salário de contribuição não pode ser tributada, independentemente de previsão na norma.

E a própria norma excludente deve ser interpretada em face da competência constitucional e o Fisco não pode instituir ou exigir pressupostos não previstos na lei, para o reconhecimento da intributabilidade.

A jurisprudência do STJ reconhece que não são integrantes do salário de contribuição as verbas de caráter indenizatório: aviso prévio indenizado (REsp 1.221.665/PR) e as férias não gozadas (REsp 973.436/SC); as de cunho estritamente social: terço constitucional de férias (Pet 7.296/PE) e os auxílios doença e acidente (REsp 120.489/CE e REsp 1.217.686/PE); e as disponibilizadas estritamente para o trabalho, como a cessão de veículo e combustível utilizados no labor (REsp 395.431/SC).

Também no que se refere à interpretação da lista de exclusão da Lei nº 8.21, de 1991, o STJ já pacificou entendimentos favoráveis aos contribuintes, como no caso do seguro de vida em grupo (REsp 759.266/RJ), o abono único (REsp 819.552), e o abono de férias, mesmo quando vinculado a critério de assiduidade do trabalhador (REsp 749.467/RS).

A tentativa de se incluir, por interpretação fiscal, requisitos não previstos em lei para reconhecer a não tributação de determinada verba tem sido rechaçada pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) e pelos tribunais.

São exemplos a tentativa de se tributar o abono único que não tenha previsão legal expressa de não integração ao salário e também a de se exigir que benefícios como assistência saúde e previdência privada sejam disponibilizados de forma idêntica a todos os empregados da empresa.

A Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF) já decidiu, no que se refere a plano de saúde, que “a exigência de outros pressupostos, como a necessidade de planos idênticos a todos os empregados, é de cunho subjetivo do aplicador/intérprete da lei, extrapolando os limites da legislação específica” (acórdão 9202.00.295). Para a previdência privada, existe precedente de turma do Carf no mesmo sentido (acórdão 2402-01.291).

O Superior Tribunal de Justiça (STJ), analisando o abono único, considerou ilegal a necessidade de previsão literal de sua não integração ao salário de contribuição, já que se trata de verba não habitual e que não tem vinculação salarial (REsp 819.552/BA).

O legislador também vem reconhecendo o equívoco da exigência de disponibilização para todos os empregados, e na mesma sistemática, de benefícios. Exemplo é a recente alteração da alínea “t”, do parágrafo 9º do art. 28 da Lei nº 8.212, que excluiu a exigência de que todos os dirigentes e empregados tivessem acesso a plano educacional ou bolsa de estudo fornecida pelo empregador, para que tal verba não seja tributada (Lei nº 12.513, de 2011).

A Procuradoria da Fazenda Nacional, por sua vez, recentemente editou atos autorizando os procuradores a não apresentarem recursos ou desistir de ações que versem sobre matérias previdenciárias já pacificadas.

Destaque-se o reconhecimento da não incidência sobre: o pagamento de auxílio alimentação in natura (Ato Declaratório nº 03/2011); o seguro de vida contratado pelo empregador em favor do grupo de empregados, sem que haja individualização do montante que beneficia a cada um deles (Ato Declaratório nº 12/2011); o abono único, previsto em Convenção Coletiva, desvinculado do trabalho e pago sem habitualidade (Ato Declaratório nº 16/11); e o auxílio-creche até o limite de cinco anos de idade da criança (Ato Declaratório nº 13, de 2011).

Dessa forma, cada vez é mais sólida a delimitação de que o salário de contribuição somente abarca as verbas pagas habitualmente, com caráter contraprestativo do trabalho prestado e que não tenham natureza indenizatória ou de benefício social, independentemente de expressa exclusão legal.

(*) é sócio do escritório Rolim, Viotti & Leite Campos Advogados.

Fonte: Tribunal Superior do Trabalho, por Alessandro M. Cardoso (*), 21.03.2012

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